A CRISE ENTRE A RDC E O RUANDA É O RAIO-X DA FRAGILIDADE POLÍTICA AFRICANA – ALEXANDRE BARROS TCP MWANA MBUNDU

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O conflito recorrente entre a República Democrática do Congo e o Ruanda não é apenas um choque militar ou diplomático. É o retrato gritante da incapacidade estrutural de África para resolver os seus próprios problemas, consequência direta de lideranças frágeis, dependentes e politicamente subalternizadas às agendas externas.

Durante décadas, chefes de Estado africanos comportaram-se como meros executores do pensamento ocidental, sempre prontos a embarcar para Paris, Washington ou Bruxelas quando o problema é interno e exige soluções africanas. As grandes potências sabem disso e usam-no: qualquer tensão entre países africanos acaba rapidamente “internacionalizada”, e decisões que deviam nascer em Addis Abeba, Kampala, Lusaka ou Luanda são tomadas em capitais estrangeiras, muitas vezes sem sensibilidade histórica, cultural ou geopolítica africana.

A União Africana: gigante no protocolo, anão na ação

A UA falha continuamente naquilo que deveria ser o seu papel principal: prevenir conflitos, mediar tensões, impor linhas vermelhas e proteger o continente das ingerências externas.

— Falhou nos golpes de Estado na África Ocidental;

— Falhou no Sudão;

— Falhou na Somália durante décadas;

— Falhou no Mali, Burkina Faso e Níger;

— E continua a falhar vergonhosamente no conflito RDC–Ruanda.

A União Africana tornou-se um espaço cerimonial, repleto de discursos bonitos, fotografias diplomáticas e silêncio constrangedor quando é necessário firmeza política.

RDC e Ruanda: dois países reféns da política de aparências

É quase vergonhoso que Félix Tshisekedi e Paul Kagame — líderes de dois Estados africanos com peso histórico e militar — tenham precisado de viajar até Washington para “assinar” paz.

Que paz é esta que depende da caneta do presidente dos EUA?

Que soberania é esta que não se sustenta sem testemunhas estrangeiras?

E o que vimos depois?

No dia seguinte ao acordo, acusações de violações de cessar-fogo, bombardeamentos e o regresso do velho ciclo de desconfiança. Ou seja: acordo para inglês ver. Paz performativa.

A presença de Donald Trump ( atual presidente, conforme o contexto político americano), e de João Lourenço como presidente da UA, apenas confirmam que o continente não consegue impor respeito nem entre os próprios irmãos africanos. Nem Washington, nem Bruxelas, nem Pequim podem criar paz entre Kigali e Kinshasa se os dois países não tiverem maturidade política para cessar hostilidades e negociar com seriedade.

O problema central

O conflito RDC–Ruanda não é novo: é alimentado pelo

✓ controlo sobre minerais estratégicos (coltão, ouro, cobalto),

✓ presença de grupos armados na fronteira,

✓ manipulação política de insegurança,

✓ interferências externas com interesses económicos profundos.

Enquanto estes fatores não forem enfrentados com coragem, nenhum acordo assinado em Washington, Genebra, Addis Abeba ou Luanda durará mais que um comunicado de imprensa.

O que África precisa fazer — Urgente:

1. A UA precisa de poder real, com capacidade de sancionar países que financiam, apoiam ou protegem grupos armados.

2. Criar uma força militar africana permanente, independente, com mandato específico para estabilizar regiões de conflito.

3. Soberania diplomática: acordos de paz entre países africanos DEVEM ser negociados em solo africano.

4. Responsabilização das lideranças que assinam acordos apenas para agradar à comunidade internacional.

5. Transparência económica nos setores minerais da RDC e Ruanda — sem isso, o conflito será sempre lucrativo para alguém.

6. Pressão continental multilateral: SADC, CIRGL, CEEAC e UA precisam de uma frente comum e firme — não reuniões vagas sem consequências.

7. Cessar imediatamente o uso político das milícias pelos dois governos. Se um país africano continua a usar grupos armados como instrumento diplomático, não pode pedir paz com credibilidade.

Conclusão pessoal.

O continente africano jamais será respeitado enquanto:

— líderes continuarem a viajar para o Ocidente sempre que precisam de resolver brigas entre vizinhos;

— a UA permanecer um órgão decorativo;

— chefes de Estado usarem conflitos para ganhos internos;

— a soberania africana continuar a ser negociada como se fosse um contrato mineiro.

A paz entre a RDC e o Ruanda só será real quando África deixar de ser espectadora da sua própria tragédia e assumir finalmente que o destino do continente se decide em África, por africanos e com coragem africana.

ALEXANDRE BARROS TCP MWANA MBUNDU – ESTUDANTE DE CIÊNCIAS POLÍTICAS E RELAÇÕES INTERNACIONAIS.

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