A FALTA DE CONTINUIDADE NAS ADMINISTRAÇÕES MUNICIPAIS: UM OBSTÁCULO AO DESENVOLVIMENTO LOCAL – WAYNDOMBIDA CIKALE

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Em vários municípios de Angola, em participar em Moçâmedes-Namibe torna-se cada vez mais evidente uma prática que mina o desenvolvimento local: a ausência de diálogo e de continuidade entre os administradores cessantes e os recém-nomeados. Esta realidade é particularmente preocupante quando se observa que, a cada mudança de liderança, volta-se a fazer auscultações comunitárias sobre problemas já identificados, discutidos e – em muitos casos – com soluções em curso.

Essa postura revela não apenas um desperdício irracional de recursos públicos, mas também uma grave desvalorização da inteligência e da paciência das comunidades. Os problemas que afligem os bairros – como a falta de água potável, saneamento básico, estradas, zonas recreativas, Praças públicas, a descontinuidade das a reservas para projectos sociais nos bairros, ampliação de escolas ou mesmo construção de novas  e serviços de saúde deficitária – são amplamente conhecidos. Repetir auscultações sem dar continuidade ao que já foi planeado é um ciclo vicioso que trava o progresso.

O município de Moçâmedes é um exemplo emblemático desta realidade. Durante o mandato de João Ernesto dos Santos, havia a visão de transformar Moçâmedes numa cidade mais verde. Contudo, com a entrada de Carlos de Sá, essa visão deu lugar ao betão afagado. Anos depois, Abel Capitango voltou a defender um município mais verde. Trata-se de uma verdadeira montanha-russa de visões sem continuidade prática.

Até onde a memória alcança, Carlos de Sá terá sido o administrador que mais promoveu auscultações e que menos produziu resultados concretos – e, ainda assim, a tendência de repetir diagnósticos continuou entre os seus sucessores.

Enquanto isso, os bairros sofrem com problemas estruturais persistentes. A fonte de abastecimento de água do município de Moçâmedes, localizada no bairro da Aida, não garante água canalizada nem para os próprios moradores da zona. A população reclama há mais de três administrações, sem resposta efectiva. No mesmo bairro, a população pede pelo menos terraplenagem do  caminho que liga Calumbiro à Aida, apesar dos constantes apelos, nada.

No bairro 5 de Abril, o projeto “Água para Todos” beneficiou algumas ruas, mas a maioria dos moradores continua há mais de sete anos a clamar por acesso regular à água potável. Situação idêntica vive-se nos bairros Plató, Bela Vista, Zona do Aeroporto e Boa Esperança, SaidyMingas II, onde a ausência de água compromete a saúde e a dignidade das famílias.

A isso somam-se problemas de segurança nos bairros, desemprego juvenil, e a ausência de uma praça pública nos bairros de Moçâmedes e que muitas vezes é causada pela ganância desmedida de alguns funcionários da Administração. A juventude clama por apoios( kits de trabalho, crédito bancário…), mas continua a encontrar portas fechadas.

É imperioso reconhecer que a boa governação exige planeamento sustentável, continuidade administrativa e cultura de Estado, e não apenas presença simbólica ou agendas individuais. A transição entre administradores deve ser marcada por relatórios técnicos sólidos, com diagnósticos claros e mapeamento dos projectos em execução, dificuldades enfrentadas e metas já traçadas.

Para corrigir esse cenário, propõem-se as seguintes acções:

1- Criação de comissões formais de transição administrativa, que garantam a entrega obrigatória de relatórios de actividades, projectos em curso e recomendações práticas ao novo administrador;

2- Implementação de Planos de Desenvolvimento Municipal plurianuais, aprovados com ampla participação das comunidades, assegurando que as prioridades locais tenham seguimento, independentemente da rotatividade política;

3- Fortalecimento dos Conselhos Municipais de Auscultação as Comunidades conferindo-lhes maior poder de seguimento e fiscalização dos compromissos assumidos pelas administrações ou o reforço dos CAC municipais, com poder deliberativo, e não apenas consultivo, para monitorar a implementação das políticas públicas

4- Promoção de uma cultura de governação baseada em resultados, com avaliação pública das metas alcançadas e responsabilização pelas gestões que negligenciem a continuidade de projectos estruturantes;

5- Transparência e publicação regular de relatórios de governação municipal, como forma de prestação de contas e fortalecimento da confiança cidadã.

É tempo de pensar menos em “marcar terreno” e mais em responder com eficácia e compromisso às legítimas preocupações do povo. A alternância de dirigentes deve ser saudável, mas não pode significar retrocesso nem esquecimento. O município não é propriedade de ninguém – é casa comum de todos os cidadãos.

Por: 𝑾𝒂𝒚𝒏𝒅𝒐𝒎𝒃𝒊𝒅𝒂 𝑪𝒊𝒌𝒂𝒍𝒆.

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