A PRESSA É INIMIGA DA PARTICIPAÇÃO – RAFAEL MORAIS

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Aprovações aceleradas no parlamento Angolano e as consequências das consultas públicas de curto prazo.

Reflexão sobre implicações desse cenário, destacando os riscos para a democracia e para a efectividade das políticas públicas em Angola

A dinâmica parlamentar tem um papel crucial na definição das políticas e direcção que um país segue. No entanto, em algumas ocasiões, o processo legislativo pode ser acelerado em detrimento da qualidade das decisões tomadas. Nos últimos tempos temos acompanhados fenómeno crescente em diversos parlamentos ao redor do mundo a aprovação rápida de legislações, acompanhada por consultas públicas realizadas em prazos curtos.

As consultas públicas são mecanismos essenciais para que a sociedade civil participe activamente do processo legislativo. Elas permitem que diferentes vozes sejam ouvidas, contribuindo para uma visão mais ampla e inclusiva das questões debatidas e além disso, asseguram transparência e legitimidade às decisões tomadas, uma vez que reflectem, em teoria, o interesse e as preocupações da população.

No entanto, quando as consultas públicas são realizadas em prazos muito curtos, a participação da sociedade tem sido sempre comprometida criando problemas especialmente grave em contextos onde as questões em pauta são complexas ou polêmicas como é o caso da nova Lei da Divisão Política Administrativa e de Segurança Nacional.

A pressa na condução dessas consultas pode resultar num feedback limitado, com a participação de um grupo restrito de interessados, muitas vezes, aqueles com maior acesso à informação e recursos para reagir rapidamente. De acordo com os dados do Instituto Nacional de Fomento da Sociedade de Informação (INFOSI), apenas 11 milhões de cidadãos usam a internet perfazendo 33 por cento da população Angolana

As consequências de uma aprovação legislativa apressada podem ser profundas e prejudiciais.

Em primeiro lugar, há o risco de que leis mal formuladas sejam aprovadas, com lacunas e ambiguidades que podem ser exploradas de maneira prejudicial no futuro.

Em segundo lugar, a falta de uma consulta pública adequada pode resultar em um distanciamento entre a legislação e a realidade das necessidades da população, levando a um aumento da insatisfação pública e à perda de confiança nas instituições democráticas.

Além disso, o processo acelerado pode ignorar ou minimizar o impacto de especialistas e de sectores da sociedade que necessitam de tempo para analisar as propostas com profundidade. Como resultado, as políticas implementadas podem ser menos eficazes e mais difíceis de corrigir, exigindo, muitas vezes, revisões e emendas que consomem tempo e recursos que deviam ser evitados.

Se olharmos para o contexto actual no mundo, diversos casos recentes em países de diferentes continentes ilustram esse problema e em alguns casos, houve uma resistência popular e violenta após a aprovação de leis controversas, levando a protestos e movimentos sociais que demandavam revisões ou revogações e Angola devia muito bem tirar lições desses acontecimentos olhando pela necessidade de um processo legislativo mais inclusivo e reflexivo.

Para garantir a qualidade da legislação e a manutenção da confiança pública, é importante que os parlamentos resistam à tentação de acelerar aprovações sem a devida consulta pública. Processos legislativos mais longos e participativos, embora possam parecer mais lentos, são fundamentais para a construção de uma democracia sólida e de políticas públicas que realmente atendam aos interesses da população.

Portanto entendo que a pressa nas aprovações parlamentares, acompanhada de consultas públicas de curto prazo, pode ter consequências graves para a qualidade da legislação e a legitimidade do processo democrático.

É importante que se busque um equilíbrio entre a celeridade necessária e a profundidade da análise e participação pública, para que as decisões tomadas sejam, de facto, representativas e eficazes.

Rafael Morais

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